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quarta-feira, 16 de junho de 2010

Relato de uma paciente americana sobre a fisioterapia

Esforço é dolorido e tedioso, segundo relato publicado no "NY Times". Médicos acabam falando pouco sobre efeitos do pós-operatório. de Caitlin Kelly

Comecei a fazer fisioterapia aos 27 anos, depois de ter escorregado em uma calçada com neve em Montreal e rompido os ligamentos do meu tornozelo esquerdo. Fiz fisioterapia novamente, aos 42 e aos 43 anos, após uma cirurgia nos meus dois joelhos. Mais recentemente, operei meus dois ombros. Meu ortopedista costuma dizer que a cirurgia é apenas a metade da batalha. Se for mesmo, ela é a metade mais fácil. O trabalho lento e repetitivo da fisioterapia geralmente começa no dia seguinte. Para lesões como um rompimento de um ligamento cruzado anterior, ela pode durar até seis meses. Antes de fazer fisioterapia, é difícil imaginar algo que vá durar tanto tempo e doer tanto. Parte do desafio é a natureza da cirurgia artroscópica, cujas várias incisões são geralmente tão pequenas que mal deixam rastro. Tive o menisco rompido e removido dos meus dois joelhos, e tenho que procurar bastante para achar minhas cicatrizes. A remoção das lesões do meu ombro através de quatro incisões deixou minha pele quase lisinha. Certamente, isso é muito bom. Porém, esses minúsculos pontinhos dificultam a compreensão do que foi feito ali dentro. Depois de apenas 45 minutos sob anestesia geral e sem nenhuma grande incisão ou ferida sangrenta, por que sinto tanta dor? E por que tenho que continuar fazendo esses exercícios bobos?

Falta de conversa
Cirurgiões têm pouco tempo, e às vezes menos vontade, de discutir as minúcias dos efeitos pós-cirúrgicos. Geralmente, são os fisioterapeutas os responsáveis por explicar pacientemente o que o médico fez e por que agora temos que dedicar uma grande parte do nosso tempo à reabilitação. A fisioterapia exige de nós o tédio mensal de passar horas em uma sala cheia de estranhos esticando borrachas coloridas ou girando os braços em círculos. Os rituais são estranhamente e intimamente públicos. Pacientes de todas as idades, raças e níveis sociais compartilham a mesma sala, ampla e iluminada. Levantamos nossas pernas lado a lado em amplas camas. Esperamos na fila para os exercícios de puxar e a bicicleta de braços. Aprendemos uma nova linguagem e suas ferramentas: a tira, o bastão, as pinças. Todo mundo acaba na fisioterapia – ágeis atletas, trabalhadores da construção civil e policiais com tensões relacionadas ao trabalho, diretores de empresa com lesões causadas pelo uso do jet ski, pessoas mais velhas com joelhos e quadris operados. Lá, simpatizei com um pastor episcopal, um professor de economia de uma das mais prestigiadas universidades e um bombeiro.

O dia-a-dia
Os rituais viram uma rotina, começando com uma almofada de aquecimento e estimulação dos nervos, terminando com a bênção confortante de uma bolsa de gelo. Aprendemos a ajustar nossas vidas em torno do inevitável, em torno da verdade fora de moda – a de que a cura dá trabalho e isso toma tempo. A camaradagem cresce à medida que pacientes comparam observações sobre as frustrações de terem de pedir ajuda para tarefas simples como vestir as próprias calças e abrir uma lata de sopa. As mulheres lastimam com o novo fato de que uma alça de sutiã pode pinçar um ombro em processo de cura como um cabo de aço. Lutando para conseguir completar até a mais simples das tarefas numa sala cheia de coleguinhas adultos e envergonhados. Quando vejo o maxilar de alguém trincar pelo esforço, imagino que um peso de 500 gramas pode ser difícil de levantar. Nunca esperei estabelecer um relacionamento de vários anos com meus fisioterapeutas, mas isso aconteceu. Eu gosto de Helen, Matt, Stephanie e Richard. Gosto mesmo. Só espero nunca vê-los novamente. Não tenho inveja do trabalho deles, esticando, balançando e manipulando nossas articulações para afrouxá-las e torná-las flexíveis. Isso já me deixou sem ar de tanta dor, algumas vezes até chorei. Não posso me imaginar infligindo dor intencionalmente, mas isso, como todo mundo aprende rapidamente, é uma parte inevitável da cura. Deve ser difícil para nossos fisioterapeutas nos animar em relação ao que, para nós, em outras circunstâncias, seriam conquistas infantis – quando obtemos novamente a capacidade de amarrar o sapato, andar reto numa sala ou jogar uma bola. Existe um lado positivo. Pelo fato de vermos nossos fisioterapeutas com tanta freqüência durante meses, passamos a conhecê-los, e eles a nós, de uma forma como nunca vamos conhecer nossos médicos. Passamos a saber onde eles moram e onde passam as férias, quem tem um novo cachorrinho em casa, quem tem um marido que mudou de emprego recentemente. Não é uma intimidade que escolhemos. Porém, tirados da nossa privacidade, das nossas vidas corridas, seja de forma relutante ou agradecida, caímos nas mãos fortes, habilidosas e preparadas dos fisioterapeutas.

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